O ambiente organizacional é um reflexo direto do comportamento dos indivíduos que o compõem. Diferenças em traços de personalidade, valores, inteligência, motivação e comportamentos impactam significativamente o desempenho coletivo e a cultura da empresa. Nesse contexto, a liderança emerge como um elemento essencial: ela direciona esforços, molda o clima organizacional e influencia diretamente a eficiência operacional.
Contudo, ainda que a literatura reconheça traços comportamentais associados a líderes eficazes, poucos estudos abordam esses aspectos sob a perspectiva psicobiológica, especialmente no cenário corporativo brasileiro. A neurociência, aliada à psicologia da personalidade, tem se mostrado uma aliada promissora para aprofundar o entendimento sobre o perfil ideal de liderança, revelando como fatores biológicos influenciam o comportamento no trabalho.
Minha recente pesquisa com líderes de empresas privadas no Brasil apontou que certos traços de personalidade - como extroversão, conscienciosidade, estabilidade emocional (o oposto do neuroticismo) e baixa amabilidade - são significativamente mais comuns entre líderes em comparação aos não líderes. Além disso, traços primários como Busca de Sensações e Ausência de Medo também se destacaram. Esses traços indicam uma maior propensão à tomada de decisões sob pressão, à busca por desafios e à disposição para assumir riscos calculados - características essenciais para lideranças em ambientes dinâmicos.
Diferenças entre os sexos também foram observadas: mulheres líderes apresentaram maiores níveis de extroversão, impulsividade e ausência de medo; já os homens líderes destacaram-se em estabilidade emocional, extroversão e conscienciosidade. Tais informações podem apoiar ações estratégicas de seleção e desenvolvimento de talentos, com base em perfis comportamentais mais adequados a cada tipo de desafio organizacional.
A neurociência mostra ainda que a liderança transformacional ativa áreas cerebrais ligadas à motivação, regulação emocional e recompensa nos liderados, influenciando diretamente o engajamento e o desempenho das equipes. Além disso, estudos sobre os sistemas de inibição e ativação comportamental sugerem que a sensibilidade à punição ou recompensa pode moldar significativamente o estilo de liderança, influenciando a tomada de decisão, a resiliência e a capacidade de inovação.
Outro dado relevante apontado na pesquisa é a correlação entre tempo de experiência e personalidade: quanto mais tempo de atuação, menor o nível de neuroticismo e maior a extroversão. Isso reforça a importância da vivência profissional no desenvolvimento de competências socioemocionais fundamentais para a liderança, como resiliência, empatia e estabilidade emocional.
Compreender esses aspectos sob a ótica das neurociências pode ser extremamente valioso para a área de Recursos Humanos. A aplicação desse conhecimento na gestão de pessoas permite a criação de programas de desenvolvimento mais eficazes, processos seletivos mais assertivos e ações voltadas à promoção da saúde organizacional. Líderes alinhados a esses parâmetros têm maior probabilidade de criar ambientes positivos, produtivos e emocionalmente seguros.
Dessa forma, integrar os avanços das neurociências ao campo dos Recursos Humanos não é apenas uma tendência, mas uma necessidade estratégica. A identificação de traços de personalidade e padrões neurocomportamentais dos líderes pode ser a chave para promover um desenvolvimento humano mais sustentável, reduzir o adoecimento psíquico e elevar o desempenho organizacional a novos patamares.
*Clarice Santana é associada da ABRH-MG. Psicóloga e Mestre em Neuroliderança; Mentora de Carreira e Head Regional MG da Stato.
0 Comentários