Museu Judaico de São Paulo exibe a obra de Boris Lurie pela primeira vez no Brasil

Boris Lurie em seu estúdio (1977). Foto - Joseph Shneberg

Sobrevivente do Holocausto e fundador do movimento No!art, artista radicado nos Estados Unidos fez do luto energia criativa

O que fazer com o luto, a raiva, a dor e o inconformismo? Com grande parte de sua família executada pelos nazistas durante a Segunda Guerra Mundial, Boris Lurie (1924-2008) passou a vida dedicado à construção de uma obra plástica irrequieta e inquietante. Até o dia 09 de julho, um conjunto importante de seus trabalhos está sendo apresentado pelo Museu Judaico de São Paulo, dando sequência a uma série de exposições realizadas pela Europa, Estados Unidos e América Latina.

Com curadoria de Felipe Chaimovich e desenvolvida com apoio da Fundação Boris Lurie, Boris Lurie - Arte, Luto e Sobrevivência percorre o legado do artista por meio de 44 colagens, desenhos, pinturas e esculturas pautados pela memória dos acontecimentos e atravessados por um forte componente erótico, às vezes sadomasoquista.

Boris Lurie Art Foundation | Boris Lurie |"Three Women" | c. 1958-1959 | Acrylic on canvas

Nascido em Leningrado, Rússia, no ano de 1924, Boris viveu sua infância e adolescência em Riga, Letônia. Em 1941, sua mãe, a avó materna, a irmã caçula e sua primeira namorada foram assassinadas após a prisão num campo de evacuação. Lurie e seu pai, por sua vez, passaram pelos campos de trabalho de Lenta e Salaspils e pelos campos de concentração de Stutthof e Buchenwald-Magdeburg e sobreviveram à Shoah. Libertos em 1945, imigraram para os Estados Unidos.

Foi em Nova York, para onde imigrou com ajuda de uma irmã mais velha, que Lurie iniciou a formação artística que lhe permitiria dar novas formas à memória. Esse processo se faz sentir, por exemplo, em O Retrato de minha mãe antes do fuzilamento, de 1947, uma evocação da figura materna e obra-chave em seu percurso de luto/criação. A partir dela, a figura da mulher se torna permanente em sua obra, assim como a estrela de Davi amarela - elemento que marcava pessoas judias durante o regime nazista e que o artista continuou a usar na sua roupa após imigrar para os Estados Unidos.

Boris Lurie Art Foundation| Boris Lurie | "Untitled (Saturation Paintings)" | c. 1959-1961 | Oil and paper collage on wood panel

"Boris Lurie produziu quadros e objetos com a estrela amarela, inclusive usando peças de roupa íntima, como cuecas e corseletes", escreve o curador, assinalando a indissociabilidade entre morte e desejo na obra do artista. "Negando-se a esquecer, sua indumentária continuava a testemunhar uma sobrevida impacificável", complementa Chaimovich.

Frequentador da escola de arte nova-iorquina Art Students League e tendo convivido com pintores gestuais como o francês Pierre Soulages, Lurie baseou-se na linguagem publicitária e na mass mídia norte-americana para trabalhar suas "pin-ups". A partir de 1955, produziu colagens críticas à objetificação do corpo feminino e, em 1960, fundou No!art, um movimento contra os valores da sociedade de consumo da época criado junto com Sam Goodman e Stanley Fisher. De volta a Riga em 1975, pela primeira vez desde a Segunda Guerra, deu início à redação de um diário de viagem, que, juntamente com uma novela de ficção, foram publicados postumamente.

Boris Lurie Art Foundation | Boris Lurie | "NO!art Bag" | c. 1974 | Oil, canvas and paper collage on burlap bag

"Um artista que sobreviveu não porque sustentado pela arte, mas por causa dela”, sugere Felipe Arruda, Diretor Executivo do Museu Judaico. “Um artista que confrontou e reelaborou por toda a vida as imagens do horror presenciado, que vocalizou em seus trabalhos o protesto contra o antissemitismo, que manipulou signos do sexo, da propaganda, do consumo, do poder e da morte para construir uma obra crítica e sem esquiva, às vezes perturbadora".

Serviço
Boris Lurie - Arte, Luto e Sobrevivência
Curadoria - Felipe Chaimovich
Período Expositivo - até o 09 de julho
Local - Museu Judaico de São Paulo (MUJ)
Endereço - Rua Martinho Prado, 128 - Bela Vista - São Paulo
Funcionamento - terça a domingo, das 10 horas às 19 horas (última entrada às 18h30)
Ingresso - R$ 20,00 (inteira) e R$10,00 (meia)
Acesso para pessoas com mobilidade reduzida
Classificação - livre
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