Foto - Rodrigo Menezes |
A temporada paulistana de Babilônia Tropical - A Nostalgia do Açúcar no CCBB São Paulo, tem suas últimas sessões. O domínio holandês no Nordeste do País no século XVII (um dos períodos mais estudados da história brasileira) é o enredo do espetáculo que fica em cartaz até 19 de novembro de 2023
Criação do diretor Marcos Damigo, drama histórico real mistura passado e presente para falar sobre o período da invasão holandesa em Pernambuco no século XVII. O elenco tem os atores Carol Duarte, que interpreta o papel de Anna Paes, Ermi Panzo, artista angolano radicado há quase dez anos no Brasil, que também assina a dramaturgia da obra, Jamile Cazumbá, artista baiana que transita pelo audiovisual e a performance; e Leonardo Ventura, ator consagrado em obras dirigidas por Antunes Filho no Centro de Pesquisa Teatral; além de Adriano Salhab, músico pernambucano que assina a direção musical do espetáculo e executa a trilha sonora ao vivo, com músicas originais.
Foto - Rodrigo Menezes |
Um grupo de quatro atores, inspirados no episódio da invasão holandesa em Pernambuco - quando a região era a maior produtora de açúcar do mundo - ensaia o espetáculo que mescla passado e presente e se desenrola a partir da tentativa de reproduzir o momento em que Anna Paes, dona de engenho da época, escreve um bilhete para o aristocrata neerlandês Maurício de Nassau, presenteando-o com seis caixas de açúcar em sua chegada ao Brasil. O bilhete está guardado até hoje no Arquivo Nacional dos Países Baixos, em Haia.
Carol Duarte destaca a importância de abordar a barbárie histórica do país. E ressalta: "como podemos olhar para o passado sem reparar que os pilares deste país foram sustentados pela escravidão? Os vilões da nossa história devem ser nomeados para que, no presente, possamos erradicar qualquer indício dessa herança escravocrata, restaurando o lugar devido para aqueles que foram capturados e para aqueles que ainda são oprimidos", afirma a atriz.
Anna Paes, uma mulher considerada à frente de seu tempo, já que sabia ler e escrever (algo raro para a época), assumiu também a administração de um dos maiores engenhos de Pernambuco com a morte do marido. Valores positivos para esse início de modernidade, como liberdade e emancipação, vão sendo desmontados, revelando a grande farsa do projeto que deu início a esse empreendimento açucareiro, que só existiu graças à escravidão.
O idealizador, dramaturgo e diretor da obra, Marcos Damigo, enfatiza: "é uma responsabilidade imensa dar vida às pessoas que vieram antes de nós, para que possamos transformar a forma como nos enxergamos e, assim, talvez, ativar nossa sensibilidade para uma melhor compreensão de nós mesmos".
O produtor do espetáculo, Gabriel Bortolini, adianta que a peça provoca reflexões profundas. "A representação histórica, exemplificada pela personagem Anna Paes, reflete nossas escolhas sobre como perpetuar a história, a imagem e seus pares. A história brasileira foi feita de brancos para brancos. Aqui, questionamos não apenas os reconhecimentos em si, mas também seus privilégios e as barreiras que precisam ser superadas para alcançar um lugar diferente", afirma Bortolini.
Destacando-se tanto na atuação quanto na dramaturgia, o ator e poeta Ermi Panzo explora a reconstrução desse período para revelar a existência do racismo como herança da escravidão, e suas implicações nos modos de nos relacionarmos com a própria ideia do trabalho.
"A obra traz uma representação vívida do cenário dinâmico do trabalho da época, que resulta em um conjunto de elementos que caracterizam a precariedade das condições de vida do trabalhador, atentando contra sua dignidade, especialmente para a maioria negra", explica Panzo.
A permanência do racismo em todas as relações também é um dos destaques que a peça traz para a atriz Jamile Cazumbá. Ela destaca que sua personagem experimenta “cotidianamente os danos, a violência e as perversidades do racismo, e de todas e diversas categorias de subalternidades estabelecidas socialmente e politicamente para que meu corpo habite”, e que a peça “é uma tentativa de abrirmos mão da suposta ingenuidade que o romantismo colonial insiste em coreografar”.
Babilônia Tropical oferece ao público uma experiência rica e instigante, com música ao vivo e recursos audiovisuais, utilizando desde imagens de arquivos históricos até filmagens realizadas em estúdio por uma equipe audiovisual, com imagens de grande impacto e beleza.
“Enfrentamos, aqui, a questão central diante do teatro contemporâneo: a chegada de temáticas antes ocultas ou apagadas que demandam novos engendramentos, tanto de relações formais, quanto de relações profissionais e pessoais; e a despeito de qualquer resposta, encontramos no caminho da escuta, da contracena e do acolhimento, nosso modo de relacionarmo-nos com tudo isso e uns com os outros; que o teatro seja canal para toda essa elaboração e que a cena possa cumprir o seu papel primordial, que é o da síntese poética”, diz o ator Leonardo Ventura.
O projeto recebeu apoio da Embaixada dos Países Baixos para o desenvolvimento da dramaturgia, o que possibilitou uma viagem do autor Marcos Damigo a Pernambuco, bem como a participação do historiador Daniel Breda no processo de pesquisa, além de uma primeira imersão com o elenco da peça em 2022. A peça estreou no CCBB Belo Horizonte, depois teve temporadas pelo CCBB Brasília e pelo CCBB Rio de Janeiro.
Sinopse
Foto - Rodrigo Menezes |
Um bilhete escrito por uma mulher em Pernambuco no início do século XVII está guardado até hoje no Arquivo Nacional dos Países Baixos. Nele, Anna Paes, uma dona de engenho descendente de portugueses, presenteia Maurício de Nassau com seis caixas de açúcar branco, assim que ele chega para governar o que era na época o Brasil holandês, em 1637. A vida dessa mulher se torna objeto de investigação de um grupo de artistas de teatro. Mas, conforme os intérpretes investigam o contexto em que esse bilhete foi escrito, emergem questões de classe, gênero e raça, revelando que o passado talvez não esteja tão remoto assim.
Ficha técnica
Babilônia Tropical - A Nostalgia do Açúcar
Idealização,Concepção e Direção Geral - Marcos Damigo
Concepção e Direção de Produção - Gabriel Bortolini
Dramaturgia - Ermi Panzo e Marcos Damigo
Elenco - Carol Duarte, Jamile Cazumbá, Ermi Panzo, Leonardo Ventura e Adriano Salhab
Interlocução Artística - Lúcia Bronstein e Sol Miranda
Direção Musical e Canções Originais - Adriano Salhab
Direção de Arte - Simone Mina
Iluminação - Wagner Pinto
Preparação Vocal e Consultoria Artística e Dramatúrgica - Glaucia Verena
Preparação Corporal - Pat Bergantin
Consultoria Histórica - Daniel Breda
Programação Visual - Rafa Saraiva e Mila Cavalcanti
Direção de Fotografia, Montagem e Finalização de Cor - Ricardo Aleixo e Julia Zakia
Vídeo Engenho em Chamas - Rafael Tenório
Coordenação de Redes Sociais - Luiz Schiavinato Valente
Design para Redes Sociais - Mayara Santana e Rafael Tenório
Assistência de Direção - Jackeline Stefanski Bernardes e Ví Silva
Assistência de Produção - Luiz Schiavinato Valente e Ví Silva
Assistência de Direção de Arte - Rick Nagash
Assistência de Cenografia - Vinicius Cardoso
Assistência de Figurino e Adereços - Amanda Pilla B e Hellige Sant’Anna
Assistência de Iluminação - Carina Tavares
Cenotécnica Cenário - Wanderley Wagner e Fernando Zimolo
Cenotécnica Filmagem - Mauro José da Silva e Matheus Kaue Justino da Silva
Cabeleireira Elenco - Vivona
Making Off - Julia Zakia
Câmera Adicional Making Off - Luiza Zakia Leblanc
Serviço
Babilônia Tropical - A Nostalgia do Açúcar
Temporada - até 19 de novembro de
Horário - quinta e sexta às 19 horas, sábado e domingo às 17h
Duração - 80 minutos
Local - Centro Cultural Banco do Brasil São Paulo
Endereço - Rua Álvares Penteado, 112 - Centro Histórico - São Paulo (próximo à estação São Bento do Metrô)
Entrada acessível - pessoas com deficiência ou mobilidade reduzida e outras pessoas que necessitem da rampa de acesso podem utilizar a porta lateral localizada à esquerda da entrada principal
Ingressos - R$ 30,00 (inteira) e R$ 15,00 (meia)
Classificação - 14 anos
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