Espetáculo Os filhos de Iauaretê, A Onça-Rei, traz olhar indígena sobre a relação entre ser humano e natureza

Foto - Sawara Silva Santos

Do livro As fabulosas fábulas de Iauaretê, de Kaká Werá, peça da Cia. Pé do Ouvido tem adaptação de Rita Carelli, direção de Thaís Medeiros e a atriz indígena Jordania Miranda no elenco

Precisamos encontrar outra maneira de nos relacionar com a natureza. Essa é a premissa do espetáculo teatral Os filhos de Iauaretê, A Onça-Rei, que a Cia. Pé do Ouvido apresenta a crianças, jovens e adultos. Dirigida pela premiada Thaís Medeiros, da Companhia Delas de Teatro, a peça é uma iniciativa das atrizes Débora Sperl e Lilia Nemes, da Cia. Pé do Ouvido, dupla que há oito anos se dedica à contação de histórias para crianças.

A montagem foi realizada com patrocínio da Secretaria de Cultura e Economia Criativa do Estado de São Paulo, por meio de prêmio do Programa de Ação Cultural (ProAC). Por conta da pandemia, o espetáculo foi registrado em vídeo e agora estreia no palco do Sesc Ipiranga.

A peça é uma adaptação do livro As fabulosas fábulas de Iauaretê (Editora Peirópolis, 1999), do escritor, ambientalista e terapeuta indígena Kaká Werá. O texto foi adaptado por Rita Carelli, artista que passou parte da infância vivendo em aldeias indígenas e têm diversos livros e filmes ligados ao tema. Para integrar o elenco, junto com Débora Sperl e Lilia Nemes, a Cia. convidou a atriz Sandra Nanayna, da etnia Tukano, por parte de mãe, e Tariano por parte de pai, que agora será substituída por Jordania Miranda, também de origem indígena.

O espetáculo conta a história de dois irmãos muito diferentes, filhos da onça-rei Iauaretê e da jovem indígena Kamakuã. Juruá é um excelente caçador que passa a destruir a mata para se sentir mais poderoso do que os outros. Iauaretê-Mirim é um solitário canoeiro que vive buscando o sol e caçando as estrelas e, por isso, segue a jornada para se tornar pajé. Por meio dos caminhos opostos desses irmãos, a peça convida o público a refletir sobre o bem viver entre nós e a Terra.

Para Débora Sperl e Lilia Nemes, idealizadoras da montagem, "o texto de Kaká Werá sugere que a harmonia entre os seres humanos e a Terra passa pela aventura de descobrir quem somos. Os dois irmãos perseguem essa jornada de maneiras opostas: Juruá a princípio se desconecta da natureza, como fazem os não indígenas, enquanto Iauaretê-Mirim aprofunda sua conexão com as forças naturais, como fazem os povos originários".

Jordania Miranda, que faz o papel de Iauaretê-Mirim, traça um paralelo entre a busca de suas origens indígenas e o personagem que interpreta. A atriz descende de indígenas do sertão nordestino, possivelmente de mulheres da etnia Tabajara ou Pankararu que foram raptadas por europeus. Por conta violência do processo de colonização, muito dessa trajetória se perdeu. "Nossos antepassados são as nossas raízes. Quando perdemos a conexão com a nossa história, perdemos a conexão com o que sustenta nossa Vida. A força para crescer está nas histórias de quem nos trouxe até aqui", diz a atriz.

Na encenação de Thaís Medeiros, as atrizes estão o tempo todo no palco, ora narrando a história, ora encenando os acontecimentos. Débora Sperl, Lilia Nemes e Jordania Miranda também se revezam nas diversas personagens da trama, muitos delas elementos da fauna e da flora brasileiras: o boto, o pirarucu, o jatobá, o jabuti, o lobo-guará etc. Assim como em histórias tradicionais indígenas, no texto de Kaká os elementos naturais têm voz: "o fantástico permeia a narrativa, em que o vento fala, o rio fala, as pedras falam, as árvores ensinam, as entidades místicas participam da vida humana e a magia é uma coisa cotidiana", explica o autor.

Para dar vida a todas essas personagens, a encenação explora gestos e movimentos corporais limpos e icônicos, numa coreografia que se desenrola ao som da trilha sonora de Dan Maia. Os ambientes da trama também são muito variados: a floresta, o fundo do rio, o Cerrado, o céu, o universo... A iluminação de Cristina Souto e o cenário de Amanda Vieira compõem a representação simbólica desses ambientes por meio de efeitos de luz, cor e sombra. No figurino de Marichilene Artisevskis, as linhas de pinturas corporais indígenas se misturam a elementos futuristas. Na trilha sonora, acontece uma fusão entre música eletrônica e instrumentos tradicionais de povos indígenas do Amazonas.

Para a diretora Thaís Medeiros “a história contada em Os filhos de Iauaretê, a onça-rei, é um reflexo do nosso tempo. Por isso, optei, em conjunto com os outros criadores do projeto, por um caminho visual que propusesse esse diálogo entre elementos ancestrais e futuristas. Para mim, era importante inserir a história num contexto contemporâneo. Eu não gostaria que o público se relacionasse com o trabalho como se se tratasse de uma história distante e desconectada da vida de pessoas que, como eu, vivem na cidade. Penso que as reflexões que o espetáculo propõe apontam para o que há de mais atual e é uma linda oportunidade para adultos e crianças repensarem suas escolhas e sua relação com a natureza”.

"Escute, Juruá, você sabe que eu não matei a sua mãe. Na verdade, salvei a vida de seus futuros filhos e netos. Tudo o que você faz, por ser poderoso, serve de exemplo a muita gente: caçando sem necessidade, tocando fogo na mata, derrubando árvores… Você está matando a mãe de todos nós! A natureza tem um limite e suas ações também", Trecho do espetáculo Os filhos de Iauaretê, a onça-rei.

Confira no vídeo trecho do espetáculo:


Ficha técnica
Os Filhos de Iauretê, A Onça-Rei
Da obra As fabulosas fábulas de Iauaretê, de Kaká Werá
Direção - Thaís Medeiros
Adaptação - Rita Carelli
Elenco - Débora Sperl, Lilia Nemes e Jordania Miranda
Preparação Corporal - Beatriz Sano
Figurino e Maquiagem - Marichilene Artisevskis
Modelista - Fernanda Binotti
Costura e Modelagem - Judite Geronimo de Lima
Iluminação - Cristina Souto
Cenário - Amanda Vieira
Produção de luminárias - Carlos Candido
Consultoria em Sombras - Pavio de Abajour
Trilha Sonora e Gravação de Vozes Off - Dan Maia
Técnica de Montagem - Fernanda Guedella
Fotografia - Sawara Silva Santos
Arte e Linguagem Visual - Bianca Habib Ateliê
Ilustrações - Rita Carelli
Idealização, Coordenação e Produção Executiva - Cia. Pé do Ouvido

Serviço

Peça infantil Os Filhos de Iauretê, A Onça-rei
Data - de 17 de abril a 08 de maio - domingos
Horário - 11h
Data - 21 de abril - quinta-feira
Horário - 11h.
Duração - 60 minutos
Local - Sesc Ipiranga
Endereço - Rua Bom Pastor, 822 - Ipiranga - São Paulo
Ingressos - R$24,00 (inteira) e R$12,00 (credencial plena, estudante, servidor de escola pública, idosos, aposentados e pessoas com deficiência). Crianças até 12 anos grátis
Classificação - livre
Informações 11 3340-2000

Bate-papo com Kaká Werá
Datas - dias 17 e 24 de abril - domingos
Horário - 12h
Duração - 30 minutos
Classificação - livre

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