23ª Mostra de Cinema de Tiradentes presta homenagem aos atores Antônio e Camila Pitanga


Camila e Antonio-Pitanga. Foto - Leo-Lara | Universo Produção

"A imaginação como potência" será a temática do evento que abre o calendário audiovisual brasileiro, em 24 de janeiro, com pré-estreia mundial de "Escravos de Jó", dirigido por Rosemberg Cariry e segue até 1º de fevereiro, com programação gratuita

A força da imaginação é o norte eleito da 23ª Mostra de Cinema de Tiradentes, a que permite que algum futuro seja vislumbrado mesmo diante de um presente saqueado pelo conservadorismo e pela legitimação da intolerância. Uma solução, portanto, é ser propositivo diante de um cenário incerto, é olhar adiante e enxergar na arte e na criação os caminhos possíveis para novos rumos. A temática da Mostra este ano segue por essa via: “A imaginação como potência”.

A Mostra será realizada entre os dias 24 de janeiro e 1º de fevereiro, na cidade histórica mineira. A curadoria, sob coordenação do crítico Francis Vogner dos Reis, propôs essa temática para reforçar que, mesmo numa época de dúvidas, o cinema brasileiro vive um momento de absoluta efervescência criativa e de recepção.

“O que emerge na atual produção no país é o desejo de interpretar nossa experiência hoje, de projetar caminhos possíveis, de provocar imagens que nos remetam a uma perspectiva sobre o passado tendo em vista não só um olhar original sobre fraturas sociais e políticas, mas também uma superação destas num desejo de futuro”, destaca Francis. “Existem filmes, documentários e ficções, que olham o presente e colocam as coisas em termos históricos, atentando para o mundo como ele é e se questionando como ele poderia ser”.

Mas como o cinema pode ser esse ambiente de preservação de um futuro sabotado? Ora, ficções e documentários, sejam em curta, média ou longa-metragem, têm sido espaço para o testemunho e registro da ação política do presente, reconfigurando formas de olhar e de abordar o que está diante da câmera.

“Os filmes imaginam outros mundos, outras possibilidades de existência, permitem ver o real transfigurado para além do fatalismo que a mediocridade política insiste em apontar como a única realidade possível”, exalta o coordenador curatorial. “Como arte, o cinema é capaz de inverter as lógicas sociais e de linguagem, de contrapor a beleza à barbárie, a provocação à conciliação. O cinema pode forçar a imaginação nos seus limites”.

Homenagem a Antônio e Camila Pitanga

Camila e Antônio Pitanga homenageados da 23ª-Mostra. Foto - Leo-Lara | Universo-Produção

Diante dessa perspectiva, a 23ª Mostra de Cinema de Tiradentes homenageia esse ano os atores Antônio e Camila Pitanga. Pai e filha, homem e mulher, negro e negra, 80 e 42 anos. Ícones de seus próprios tempos, por motivos e trajetórias distintas, Antônio e Camila emulam em seus corpos e suas posturas a brasilidade mais original e singular, o talento e a presença de quem vivencia as contradições do país por dentro. Para Francis Vogner dos Reis, “homenagear os dois juntos é afirmar não só suas trajetórias, mas também reconhecer suas diferenças - criativa, simbólica e política”.

Entre a centralidade de Antônio Pitanga na revolução do Cinema Novo, entre o final dos anos 1950 e meados dos anos 1970, e a constância de Camila Pitanga no imaginário da TV e do cinema nas últimas duas décadas, estão a diversidade e a força de duas formas de trabalhar e mapear uma história do audiovisual brasileiro que atravessa ambos.

Pitanga, o pai, nasceu em 1939 em Salvador. Fez teatro e cinema desde muito jovem e estreou nas telas em 1960 com “Bahia de Todos os Santos”, de Trigueirinho Neto. Seguiu numa série de filmes marcantes que remodelaram todo um jeito de fazer cinema no Brasil: “A Grande Feira” (Roberto Pires, 1961), “O Pagador de Promessas” (Anselmo Duarte, 1962), “Barravento” (Glauber Rocha, 1962), “Ganga Zumba” (Carlos Diegues, 1963), “Os Fuzis” (1964) e por aí adiante.

“Quando ele surge, sua presença impõe uma energia e radicalidade de gestos que destoavam do ritmo mais lento e calculado de atores até então em voga”, afirma Francis. “A liberdade dos personagens de Pitanga era plena e na contramão do mundo. Entre os heróis do Cinema Novo, ele era o único que de fato preconizava uma liberdade à revelia da violência cerceadora do mundo ao qual os filmes se referiam”.

Para o curador, essa liberdade aparecia no corpo, com os personagens de Pitanga constantemente se insurgindo contra a violência do presente, porque atento às circunstâncias, e do futuro, porque revolucionário. “Em Antônio Pitanga, essas temporalidades coexistem”, define Francis.

Pitanga, a filha, nasceu em 1977 no Rio de Janeiro. Estreou nos cinemas ainda criança, junto com o irmão Rocco, num filme emblemático: “Quilombo” (1984), de Carlos Diegues, que marcou época por reunir um histórico elenco negro que incluía Grande Otelo, Zezé Motta, Antonio Pompêo, Tony Tornado, Léa Garcia, Milton Gonçalves, Zózimo Bulbul e Antônio, pai de Camila.

Dali adiante, a trajetória cinematográfica de Camila Pitanga transitou por praticamente todos os tipos de filmes realizados do Brasil desde a Retomada nos anos 1990: infantil (“Super Colosso”, Luiz Ferré, 1995), comédia derivada da TV (“Caramuru - A Invenção do Brasil”, Guel Arraes, 2001), drama histórico (“O Preço da Paz”, Paulo Morelli, 2003), aventura social (“Redentor”, Cláudio Torres, 2004), radicalismo (“O Signo do Caos”, Rogério Sganzerla, 2004), melodrama criminal (“Eu Receberia as Piores Notícias de Seus Lindos Lábios”, Beto Brant, 2011) e documentário, filmando justamente a trajetória do pai, em “Pitanga” (2017, codireção de Beto Brant).

Mostra homenagem: pré-estreia mundial de “Os Escravos de Jó”

Para abrir a 23ª Mostra de Cinema de Tiradentes, o filme escolhido trafega na imaginação libertária do cinema brasileiro e tem Antônio Pitanga no elenco. “Os Escravos de Jó”, do diretor cearense Rosemberg Cariry e filmado em Ouro Preto, estará em pré-estreia mundial na noite de 24 de janeiro, no Cine-Tenda.

No filme, o 12º longa-metragem de Cariry, os estudantes Samuel e Yasmina se apaixonam na cidade mineira e precisam vencer dificuldades e preconceitos para afirmarem o amor. Personagens do passado e do presente cruzam os caminhos dos jovens, arrastando-os para um inesperado destino.

No enredo, Pitanga interpreta um livreiro amigo do protagonista e foi especialmente convidado para o papel pelo diretor Rosemberg Cariry. “Ele faz esse velho livreiro de ascendência judaica, chamado Jerémie Valés, imigrante do norte da África com história de vida passada também na França. Um personagem que viveu os horrores da Segunda Guerra Mundial, mas que manteve viva a esperança e a chama da poesia”, conta Cariry.

Para o cineasta, ter Antônio Pitanga em “Os Escravos de Jó” foi um privilégio. “Ele é um grande ator, por quem tenho admiração e respeito. Afora o reconhecido talento para o cinema e para o teatro, Pitanga é uma pessoa de alma boa, do bem. Está sempre disposto a colaborar e faz, com a sua criatividade, o filme crescer”, exalta Cariry. “Além do extraordinário artista que é, Pitanga é um cidadão politicamente consciente e de ideias libertárias. Em resumo: é um grande brasileiro, um dos símbolos do nosso povo e do nosso cinema”.

O longa-metragem "Na boca do mundo" (1978), com direção e atuação de Antônio Pitanga, e os longas "Eu receberia as piores notícias de seus lindos lábios" (2011), de Beto Brant, com Camila Pitanga no elenco; e "Pitanga" (2016), dirigido por Camila sobre a trajetória e carreira do pai, completam a seção Mostra Homenagem.

Sobre a Mostra

Maior evento dedicado ao cinema brasileiro contemporâneo em formação, reflexão, exibição e difusão realizado no país. Apresenta, exibe e debate, em edições anuais, o que há de mais inovador e promissor na produção audiovisual brasileira, em pré-estreias nacionais, de longas e curtas - uma trajetória rica e abrangente que ocupa lugar de destaque no centro da história do audiovisual e no circuito de festivais realizados no Brasil. Trata-se de um programa audiovisual que reúne todas as manifestações da arte numa programação cultural abrangente oferecida gratuitamente ao público que prevê a exibição de mais de 100 filmes brasileiros em pré-estreias nacionais, mais de 40 sessões de cinema, homenagens, oficinas, debates, seminário, mostrinha de cinema, exposições, lançamento de livros, teatro de rua, shows musicais, performance audiovisual, encontros e diálogos audiovisuais e atrações artísticas.

Serviço
23ª Mostra de Cinema de Tiradentes
Período - de 24 de janeiro a 1º de fevereiro de 2020
Locais - Centro Cultural Sesiminas Yves Alves, Largo das Fôrras e Largo da Rodoviária
Patrocínio - CODEMGE | Governo de Minas Gerais
Parceria Cultural - Sesc em Minas
Incentivo - Secretaria de Estado de Cultura | Minas Gerais
Idealização e realização - Universo Produção
Mais informações 31 3282-2366 ou clique aqui
Toda programação é oferecida gratuitamente ao público. Lei Federal de Incentivo à Cultura. Lei Estadual de Incentivo à Cultura. Ministério do Turismo - Governo Federal | Ordem e Progresso

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